sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Das últimas coisas

Como é estranho. Parece que nossa emoção funciona sempre ao contrário da razão, só pra sacanear. Fiquei o ano passado todo morando fora, morrendo de voltade de voltar pra velha casa. E agora que finalmente aconteceu, percebi que me dói sair dali. Hoje fui buscar minhas últimas coisas e dar uma última olhada na casa. Tinha me preparado para render graças por finalmente sair de lá. Mas... conforme andava pelos cômodos, parece que minha mente resolveu reviver todas as coisas que se passaram comigo enquanto morava ali. Foi só um ano? Sim, só um ano. Exteriormente pouco aconteceu. Mas, com certeza, foi o ano em que mais coisas aconteceram dentro de mim. E foi por aqueles cantos que chorei, que gritei, que quebrei coisas, que cantei e dancei sem que ninguém visse ou soubesse. (Com exceção do vizinho, talvez. Me desculpe por isso rs). Foi onde realmente aprendi a cozinhar, e pra isso quebrei o fogão uma vez tentando lavá-lo e sujei a parede de óleo tantas outras. E realmente aprendi a cuidar de uma casa. Bom... realmente acho que aprendi.
Foi sentada naquela varanda que questionei a vida e a morte, as crenças e a falta de fé. E foi olhando pro céu daquele quintal que eu agradeci a Deus por me mandar as estrelas. Pode parecer idiota agradecer pelas estrelas. Talvez seja. Mas naquela cidade sem prédios, com um céu tão limpo, olhar para aquelas estrelas era um espetáculo que sempre achei digno de gratidão. Até porque ali eu só podia falar com Deus.
Foi o ano em que amei e desisti de amar. O ano em que eu descobri que nunca tinha amado na verdade. E o ano em que eu abri mão de tentar. E abri mão de tanta cobrança. Foi o ano em que chutei o balde, destruí tudo. E foi o ano em que comecei a reconstruir quem eu sou. Ali, olhando para aquelas paredes, contando os pisos no chão. Um ano sem televisão nem internet. Sem amigos por perto. Sem nada pra fazer. Foi o ano em que inevitavelmente precisei olhar pra mim e, sem querer, começar a me encontrar.
Foi o ano que mais doeu. Foi o melhor ano da minha vida.
Paguei o último aluguel, tive minha última conversa com o proprietário, paguei as últimas contas (atrasadas) e peguei as últimas coisas que tinha deixado pra trás. Arranquei os adesivos da parede, e parte da parede junto. Doeu meu coração. Parecia que era ele que eu estava rasgando. Parecia que ele estava ofendido por ser obrigado a deixar um lugar onde ele viveu tantas coisas. Ou talvez fosse só meu bolso reclamando de ter que comprar tinta pra repintar a parede. Vai ser como apagar dali tudo o que eu vivi para que outra pessoa venha viver outras coisas. É idiota se sentir ofendido com isso? Talvez eu seja idiota, afinal.
Liguei pela última vez pra Telefônica pra reclamar mais uma vez de outra conta que chegou cobrando por serviços que nunca foram prestados, e que eu havia pedido desde o começo do ano. E cancelado umas duas vezes (sem resultado).
Mas o que mais me doeu foi abrir um pote e achar um último pedaço de cebola que havia ficado esquecido. Claro, ele havia brotado e estava cheio de ramos e raizes. Dei risada, é claro, pois TODAS as minhas cebolas e alhos brotaram esse ano. Nunca dava tempo de consumi-los inteiros. Resolvi plantar pela última vez uma cebola no quintal de casa, mesmo que eu nunca tenha tempo de vê-la crescer e nem possa cuidar dela. Peguei emprestada a enxada do vizinho e cavei um buraco, onde plantei pela última vez uma cebola naquele quintal. E foi ali, toda suja de terra que eu sorri, olhei pra casa, e me dei conta pela primeira vez de como eu vou sentir falta daquele lugar.

2 comentários:

  1. Poxa Feer, qe emocionante mesmo! Deu pra ter uma boa ideia do que vc passou nesse ano...Agora vida nova, tudo novo! O que ficam são as experiências..valeu a reflexão sobre tudo. Beijs ;)

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